sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Terra indígena é o próximo alvo dos ruralistas


Por Caio Junqueira De Brasília - Valor 08/12

Após a aprovação do Código Florestal no Senado e sua provável aprovação em tramitação na Câmara, para onde volta porque houve modificações do texto, a bancada ruralista no Congresso Nacional se mobiliza para mais um embate com ambientalistas. Trata-se da proposta de emenda constitucional (PEC) 215, que transfere do Executivo para o Legislativo a competência exclusiva para aprovar a demarcação das terras indígenas e ratificar as demarcações já homologadas. Também estende essa prerrogativa na demarcação de áreas de conservação ambiental e terras quilombolas.

A discussão sobre a PEC parou ontem e anteontem os trabalhos da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, onde a proposta atualmente tramita. Os ruralistas lotaram as sessões e conseguiram aprovar um requerimento de inclusão da PEC na pauta, que foi aprovado. Com ampla maioria, estava prestes a ser votado quando deputados do PT mobilizaram o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo que, por sua vez, acionou o líder do governo na Casa, Cândido Vaccarezza, para tentar impedir a apreciação.

"Vim aqui a pedido do Ministério da Justiça para que esta votação não seja realizada hoje. Minha proposta é que discutamos a PEC ainda neste ano com o ministro e na primeira sessão da CCJ em 2012 ela seja votada. E se ela for aprovada, viabilizaremos a comissão especial para discuti-la", afirmou. Embora com alguma discordância, os ruralistas concordaram. Mas já elegeram a PEC como prioridade para 2012.

"Aprendemos com o Código Florestal que temos de enfrentar os problemas aqui, ser pró-ativos. Esse projeto ficou barrado aqui com muitas manobras, principalmente do PT e dos setores ligados à Igreja", afirmou ao Valor o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Moreira Mendes (PSD-RO).

Apresentada em 2000 pelo empresário rural e deputado Almir Sá (hoje no PR de Roraima), foi primeiro relatada pelo padre e atual deputado Luiz Couto (PT-PB), que pediu sua inadmissibilidade. Acabou não sendo votada e, em consequência, arquivada. Mas já na última legislatura os ruralistas pediram seu requerimento. Um novo relator, Geraldo Pudim (PMDB-RJ), foi designado, e apresentou parecer favorável à PEC. Só que novamente foi remetida ao arquivo, sem apreciação.

Em fevereiro foi mais uma vez desarquivada e em maio foi designado o novo relator, Osmar Serraglio (PMDB-PR), também vice-líder do governo. Em seu parecer, ele acabou por se manifestar pela admissibilidade da PEC 215 e de outras 11, sendo nove semelhantes a ela e duas que pretendem permitir ao Congresso que, além das terras indígenas, também seja responsável pela demarcação de terras quilombolas e de unidades de conservação ambiental.

Foi a senha para que os petistas na CCJ se revoltassem. "Eles querem avançar sobre novas terras e vêm com a justificativa de que tudo ocorre à revelia. Estão com raiva porque, no modelo atual, o Estado atribui para si essa responsabilidade de demarcar e homologar essas terras", afirmou Sibá Machado (PT-AC). "A PEC é inconstitucional porque fere o princípio da separação de poderes a partir do momento em que dá ao Congresso uma função que é do Executivo. Além disso viola direitos e garantias individuais", disse Alessandro Molon (PT-RJ).

Os ruralistas apontam aí uma reação "ideológica" do PT. "A CCJ não discute o mérito, só a admissibilidade. O mérito será discutido em uma comissão especial, por se tratar de emenda constitucional", disse Moreira Mendes. Ele afirmou também que "há uma criação indiscriminada de terras indígenas no país" e que "cada reserva indígena que se cria resolve-se o problema de meia dúzia de índios mas cria problemas a milhares de outras pessoas". Para o deputado Vilson Covatti (PP-RS), a demarcação de terras é feita hoje de forma unilateral. "Um antropólogo nomeado pela Funai é quem decide. Tem área escolhida que índio nunca habitou."

Ambientalistas farão pressão sobre Dilma

De Brasília
O retorno do Código Florestal à Câmara dos Deputados, uma vez que foi aprovado com modificações pelo Senado, na noite de terça-feira, deve reiniciar a disputa entre ruralistas e ambientalistas que marcou a tramitação do projeto no primeiro semestre deste ano. O motivo é que os ruralistas querem alterar pelo menos quatro artigos aprovados pelos senadores, enquanto os ambientalistas, em menor número, desistiram de atuar no Congresso e pretendem apresentar à presidente Dilma Rousseff suas sugestões de veto.

Ontem à tarde, enquanto aguardavam a chegada do texto aprovado no Senado, os principais expoentes da bancada ruralista se reuniam na sala da Comissão de Agricultura para traçar a estratégia. O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Moreira Mendes (PSD-RO), defendia que o texto seja aprovado na Câmara ainda neste mês e que sejam alterados quatro artigos.

A começar pelos oito princípios arrolados no primeiro artigo do projeto. "Toda lei deve começar com um enunciado, dizer para que se destina. Meu receio é que venha o Ministério Público e interprete a aplicação da lei de acordo com esses princípios", disse Mendes. Ele também defende que sejam retirados do texto duas emendas do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), uma que confere competência ao comitê de bacias para aumentar as Áreas de Preservação Ambiental (APPs) e outra que diz que APPs dentro de áreas de conservação não podem ser consolidadas. Segundo ele, a quarta emenda foi proposta pelo senador Blairo Maggi (PDT-MT) e determina que quem desmatou após 2008 tem que parar de utilizar a área e comprovar seu processo de recuperação.

Com ampla maioria na Casa, sua expectativa é de que consigam aprovar essas alterações. Ainda mais porque há um acordo sendo feito de que o novo relator do código na Câmara será um deputado do PMDB, bancada que concentra boa parte de ruralistas da Câmara. Os nomes citados são de Celso Maldaner (SC), Edinho Bez (SC), Paulo Piau (MG) e Valdir Colatto (SC).

Entretanto, para o deputado Sarney Filho (PV-MA), líder do PV na Câmara, qualquer alteração no texto que sinalize maior prejuízo ao ambiente deverá ser vetado pela presidente Dilma Rousseff. "Se eles resolverem voltar ao projeto original, haverá veto, na hora, não tenho a menor dúvida", disse. Ele afirmou ainda que o partido deve ler um manifesto no momento da votação e se retirar do plenário. O que mostra que a estratégia agora está no Palácio do Planalto: é convencer Dilma a vetar os trechos que os ambientalistas consideram equivocados. "Não há muito o que fazer, somos minoria. Agora é colocar para a presidente a responsabilidade." (CJ)

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Senado aprova texto-base do Código Florestal com concessões a ruralistas

Por Raquel Ulhôa | De Brasília - Valor 07/12

Após cerca de cinco horas de discussão e negociações finais entre o relator, Jorge Viana (PT-AC), e a bancada ruralista, o plenário do Senado aprovou às 22h, em votação simbólica, o substitutivo elaborado em conjunto com o senador Luiz Henrique (PMDB-SC). Houve pedido de verificação de nominal dos votos e o placar indicou 59 votos a favor e sete contra o parecer. Às 22h30 ainda faltava a votação dos destaques.

Ao longo do dia, houve intensa negociação no próprio plenário. Viana acolheu duas emendas do setor rural. Uma trata da proteção das bacias hidrográficas consideradas "críticas". Nesse caso, a consolidação das atividades rurais nessas áreas será decidida pelo Poder Executivo local, em vez do comitê de bacia competente.

A outra emenda, reivindicação da bancada ruralista, trata dos biomas apicuns e salgados - pertencente aos manguezais. A emenda manteve a permissão de criação de camarão e extração de sal nessas áreas até 22 de julho de 2008. A partir daí, será permitida as atividades em 10% na Amazônia e 35% nas demais regiões do país.

No discurso, Viana afirmou que o código proposto "não tem trela para desmatador", mas "estende a mão para o produtor que quer sair da ilegalidade". O substitutivo obriga a recomposição de mata ciliar na margem dos rios. A área a ser recomposta tem que ser de 15 metros em caso de curso d'água de até dez metros de largura e nos rios mais largos, tem que ser correspondente à metade da largura do rio (sendo no mínimo 30 metros e no máximo 100 metros). Como está sendo alterado, o projeto retornará à Câmara.

O texto, negociado com o Ministério do Meio Ambiente e os ruralistas, foi votado sem o ambiente conflituoso da sessão na Câmara dos Deputados.

Antes da discussão do código, houve um embate verbal entre o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e o líder do DEM, Demóstenes Torres (GO). O episódio começou quando o governo conseguiu aprovar - por 36 votos a favor e 19 contra- inversão da pauta de votações, colocando a proposta de emenda constitucional (PEC) da Desvinculação de Receitas da União (DRU) em primeiro lugar.

O líder do DEM cobrou de Sarney que, em vez do Código Florestal, fosse votado o projeto da regulamentação da Emenda Constitucional 29, que fixa percentuais mínimos que os governos têm de investir em saúde. Essa proposta tramita em regime de urgência, assim como o Código Florestal, e era o primeiro item da pauta. Demóstenes criticou a condução de Sarney, que estaria descumprindo acordo feito na semana passada. Acusou Sarney e governo de "burlarem de maneira torpe o entendimento que fizemos".

Irritado, Sarney pediu que a palavra "torpe" fosse retirada das notas taquigráficas e, ao descer da Mesa, aproximou-se de Demóstenes e, dedo em riste, cobrou desculpas. "Vossa excelência me deve desculpas. Me respeite", disse. Logo depois, o líder do DEM, ao microfone, pediu desculpas a Sarney.

Com a decisão da presidente Dilma Rousseff de não negociar aumento de recursos para a saúde em troca da votação da DRU, o governo vai propor hoje a retirada da urgência do projeto que trata da regulamentação da emenda da saúde. Vários senadores da base querem votar a favor da proposta original, que amplia o percentual que a União tem que investir no setor. O governo é contra. Por isso, a votação desse projeto deve ficar para o próximo ano.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Chevron enfrenta problemas para cimentar poço



Por Cláudia Schüffner | Do Rio - Valor 5/12

Além de ter a licença de perfuração cassada sob acusação de negligência e um poço interditado depois do vazamento em Frade, que vai reduzir em 7 mil barris diários a produção da área, a Chevron está enfrentando problemas técnicos no programa de "abandono" do poço. O abandono é a cimentação dos 2.145 metros de área perfurada através da colocação de tampões de cimento alternadamente.

Procurada desde a quarta-feira, a empresa americana não respondeu às perguntas sobre os procedimentos adotados até agora. Informou apenas que instalou o segundo tampão e no dia 1º de dezembro foi realizado outro teste para avaliar a cimentação, cujos resultados estão sendo interpretados. Só então a empresa vai passar para a próxima etapa.

A Chevron não informa quantos tampões estão previstos nem os prazos com os quais trabalha para encerrar a cimentação do poço. Fontes da indústria explicaram que em condições normais, o abandono de um poço na bacia de Campos é feito entre uma semana e 15 dias. É uma tecnologia dominada, mas a Chevron completou 20 dias de tentativas na sexta-feira - contados a partir do dia 13, quando apresentou o primeiro projeto aprovado em regime de urgência pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).

A lâmina d'água, que no caso do poço de Frade é de 1.184 metros, não é um fator tão importante no abandono como a profundidade do poço a partir do leito marinho. Quanto mais profundo, mais tempo leva. Considerando que claramente a Chevron está tendo problemas, a estimativa é que processo demore 30 dias, no mínimo.

O embaraço causado pela sequência de falhas operacionais da quarta maior empresa de petróleo no mundo ao operar na bacia de Campos também vem constrangendo outras companhias que operam no país. Na quinta-feira a ANP informou que um poço foi fechado porque a Chevron não notificou a presença de gás sulfídrico, como prevê o manual de segurança operacional da agência. "Qualquer um sabe que é necessário notificar a ANP e tomar as providências. É impressionante o que a Chevron está fazendo", disse um experiente executivo.

A avaliação é de que a inabilidade da companhia, principalmente com autoridades, coloca a indústria sob redobrada vigilância, o que é fato. Uma autoridade vai mais além ao avaliar que a Chevron fez "uma série de lambanças" no país. Já uma parte dos analistas ficou com a impressão de que há uma exagerada reação, que tem fundamento político.

Ricardo Corrêa, da Ativa Corretora, observa que a sociedade não tem meios para julgar o que aconteceu. "Mas é aí que entra a governança, a transparência das informações por parte da Chevron e também do governo. Eu gostaria de ter condições de fazer um julgamento. Se o incidente foi grave, talvez o mais importante seja o fato de os instrumentos financeiros de punição serem restritos e mal desenhados", afirma o analista.

Até agora a Chevron demonstrou pouco conhecimento sobre a regulamentação brasileira para operar no setor. Isso já vai custar uma das três multas que serão aplicadas pela ANP. Uma delas por não cumprir o plano de abandono aprovado pela agência.

O próprio presidente da Chevron para a África e América Latina, Ali Moshiri, não parece informado sobre requerimentos para importação de equipamentos. Ao justificar a decisão de mudar o primeiro projeto de abandono porque a empresa precisou de um cortador especial para a coluna de perfuração não disponível no país, ele afirmou que pode trazer equipamentos de qualquer parte do mundo rapidamente.

E questionou entendimento da ANP de que eles deveriam estar no Brasil no momento em que a perfuração começou. Moshiri citou a distância de seis horas entre Angola, na África, e o Brasil como exemplo de rapidez de acesso a equipamentos. A frase mostra desconhecimento dos procedimentos alfandegários. Um oficial da 7ª Região Fiscal da Receita Federal estima que um equipamento de grande porte demora de três a sete dias para entrar no país, desde que o processo inicial não tenha pendências. "Existe uma série de trâmites, tanto em casos de bens como de pessoas, como em qualquer país do mundo", disse. Em caso de emergência "com grave dano ao ambiente e ao contribuinte" como no caso de um vazamento de petróleo no mar, explicou, "o prazo pode ser menor, desde que se prove a emergência".

Os trâmites alfandegários variam de acordo com o regime de importação: para o equipamento que vai ficar no país é preciso uma Declaração de Importação (DI) no aeroporto ou no porto. Já sob o Regime Aduaneiro Especial de Exportação e Importação (Repetro), para bens sem similar nacional, o é preciso apresentar um Ato Declaratório da Divisão de Controle Aduaneiro (Diana). É o que mais demora, pois representa renúncia fiscal do país. O terceiro regime é a Admissão Temporária, para equipamentos que não vão ser importados nem nacionalizados.