segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Brasil quer meta econômica e social em pacto da Rio+20



Por Assis Moreira Valor 30/01
De Davos

O Brasil vai impulsionar por um novo pacto pelo desenvolvimento sustentável na Rio+20, com elaboração de três tipos de metas - ambientais, sociais e econômicas - a serem aplicadas a todos os países, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, em entrevista ao Valor.

"Já existe uma corrente de opinião significativa a favor disso, mas ainda está cedo no processo preparatório para ser mais afirmativo'', declarou. "As metas não são compromissos quantificáveis, cobráveis, mas sinalizam compromissos da comunidade internacional com o desenvolvimento sustentável."

A cinco meses da grande conferência que levará os líderes mundiais ao Rio, o Brasil impulsionou no Fórum Mundial de Economia, em Davos, o debate sobre economia verde, sustentabilidade da produção e questões sociais, incluindo redução da pobreza.

Na visão brasileira, diante do fiasco dos modelos existentes, existe a necessidade de, ao se falar em desenvolvimento sustentável, levar em conta a inclusão social e também mecanismos econômicos e de mercado para financiar energia renovável, por exemplo.

Analistas concordaram que o mundo se habituou a coisas estanques e não é fácil mudar essa concepção. Mas Patriota acredita que o contexto contribui para "uma nova utopia, em vez de sacrifícios sem esperança, para mobilizar todos os setores da sociedade''. Para certos analistas, buscar outro modelo de desenvolvimento é uma evidência, inclusive quando se projeta um bilhão de novos consumidores nos países em desenvolvimento na próxima década.

Em Davos, num debate no qual Patriota participou com o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, o diretor do WWF Jim Leape, representantes governamentais e empresários como Paul Polman, da Unilever, surgiram propostas específicas para a cúpula do Rio, como a criação de um novo mecanismo chamado "Green Gross Domestic Product", que levaria em conta fatores ambientais e de sustentabilidade; eliminação de subsídios que contribuem para a degradação ambiental, como os para combustíveis fósseis; e estabelecimento de critérios de sustentabilidade nos financiamentos para o desenvolvimento.

Participantes reiteraram esperar que a cúpula do Rio resulte em metas concretas, realísticas e mensuráveis ou iniciativas a serem lançadas, em vez de meras discussões. Alguns sugeriram a criação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, nos moldes das Metas de Desenvolvimento do Milênio, estabelecidas pelas Nações Unidas para combater a pobreza, com a diferença que estas são aplicadas apenas nos países em desenvolvimento.

O Brasil, como o país organizador, assume papel de liderança no processo e quer metas para todos os países, mas de maneira voluntária, certamente não ignorando que mesmo isso é difícil de ser aceito por algumas nações.

Patriota disse esperar um forte engajamento das empresas, e identificou em Davos vários líderes empresariais que querem desempenhar papel ativo na Rio+20. Uma coalizão de empresários começou a surgir no Fórum de Davos para ajudar a avançar em problemas como eficiência energética. Um participante falou tambem em examinar questão de desmatamento ilegal.

Existe a questão sobre como muitas empresas, principalmente nos países em desenvolvimento, vão "descarbonizar" sua produção, ou seja, torná-la mais eficiente e reduzir as emissões de carbono. Para o ministro brasileiro, "às vezes a adaptação é cara no primeiro momento e vantajosa no médio e longo prazos''.

Outro ponto da agenda é sobre a governança. Dificilmente será criada uma organização ambiental mundial, até porque a ideia é justamente ampliar o conceito de desenvolvimento sustentável. O mais provável é o reforço de entidades existentes ou criação de um Conselho de Desenvolvimento Sustentável, nas Nações Unidas, que aumente o poder de pressão para os países adotarem políticas nessa área.

Com relação às Metas de Desenvolvimento do Milênio, a avaliação em Davos foi mista, com dois terços dos objetivos podendo ser alcançados até 2015. Mas isso é obscurecido pelo sentimento de crescente de exclusão e de corrupção em vários países.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Ambiente à direita

Por Werter de Macêdo

A identificação da esquerda com a questão da preservação ambiental sempre foi ambígua.
Quem já leu Marx sabe que ele compartilhava com os iluministas e os positivistas do século XIX a crença, para muitos ingênua, de que o progresso tecnológico resolveria a questão ambiental. Todavia, não lhe passava despercebido a pressão que o modo de produção capitalista exercia sobre os recursos naturais.

No livro de Engels “a situação da classe trabalhadora em Londres”, a descrição da poluição do ar na 1º fase da revolução industrial, ainda à base do carvão mineral, encontram-se passagens dignas de compor a ontologia de qualquer militante da chamada onda verde. A crítica de Marx e de Engels é de que o modo de produção capitalista é anárquico e isso leva ao extremo a contradição homem-natureza.

Mas nem Marx, nem Engels, Lênin, Stálin, Trotsky podem ser identificados com ideias de paralisar o progresso técnico em nome da preservação ambiental.

Portanto, o fato em si de aprovar o código florestal entrando aqui e ali em desacordo com as teses do partido verde, na minha opinião, não descaracteriza o PC do B como partido de esquerda.

Nas próprias eleições presidenciais aqui no Brasil, o partido verde rachou. Uma parte votou com Dilma (esquerda), a outra com Serra que representou a direita, embora ele não seja um homem de direita. E a sua líder suprema, uma espécie de santa da nova religião, ficou em cima do muro.

Na Europa, não tem sido incomum a aliança de partidos verdes com coalizões de centro-direita. Existe inclusive uma apropriação dessas bandeiras por parte do capital financeiro. Sim há banqueiros em Wall Street que apostam na via verde, na renovação da base tecnológica tendo como pano de fundo a questão ambiental. Aqueles setores para quem a taxa de desemprego não é problema. Ou melhor, é problema apenas para os pobres. Eles que esperem até que se produza a nova tecnologia auto-sustentável.

E se isso cria problemas urbanos, favelização, invasões, é muito simples de resolver. Chama a PM e desce o pau na negada, na escória, escumalha, naquele antro de ladrões e vagabundos como foi feito em Pinheirinho – São Paulo.
Essa é a solução da direita ecológica para a questão ambiental.


Werter de Macêdo é analista do BC



quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Logística da Rio+20 prevê evento inédito na história da ONU

Valor 19/01

"É preciso que se entenda que durante dez dias o Rio de Janeiro será a ONU", diz o diplomata Laudemar Aguiar, 50 anos, fluminense de Niterói e responsável por toda a logística do que o governo brasileiro quer que seja "a maior conferência da história das Nações Unidas". Ele trabalha com grandes números: 150 chefes de Estado e de governo e 50 mil diplomatas, jornalistas, empresários, políticos e mais gente cadastrada a circular pelo Riocentro, onde acontecerá a cúpula da ONU, em junho. E mais dezenas de milhares de pessoas - um número ainda mais difícil de estimar -, que irão aos eventos programados pela sociedade civil no Aterro do Flamengo, no Centro e na Barra da Tijuca. "O Rio será o umbigo do mundo", celebra.

Mas, para o superlativo dessa megaoperação se confirmar, não depende da vontade do governo. O conteúdo da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (o nome formal da Rio+20), determina seu papel político e a importância dos líderes que virão. Na famosa conferência do clima de Copenhague, em dezembro de 2009, foram 47 mil inscritos e 120 líderes - 40 deles confirmaram presença apenas dois dias antes do evento, quando o presidente Barack Obama finalmente disse que ia. Mas Copenhague não deu lá muito resultado, e o evento seguinte, em Cancún, no México, se ressentiu - foram 20 mil credenciados e apenas 22 líderes mundiais.

A Rio+20 faz parte de outra família de conferências da ONU, a que discute como o planeta quer se desenvolver, iniciada há 20 anos com a Eco 92 (ou Rio 92), e que teve outra edição de peso em Johannesburgo, na África do Sul, há 10 anos. Será um debate importante sobre desenvolvimento sustentável com sua vertente econômica, ambiental e social, tendo como pano de fundo a redução da pobreza e a "economia verde", conceito que pressupõe o usode tecnologias limpas. Mas não produzirá nenhuma Convenção, como a conferência-mãe, quando surgiram os dois importantes acordos ambientais contemporâneos, a convenção do clima e a da biodiversidade.

Na Eco 92 vieram ao Rio 109 líderes e mais de 30 mil pessoas circularam no evento oficial, que também foi no Riocentro. O conteúdo da Rio+20, bem mais modesto, começa a ser discutido este mês, em Nova York. O nível de ambição do que será obtido em junho, no Rio, depende das negociações até lá, dos rumos da campanha eleitoral nos EUA e da crise econômica global.

O trabalho de Laudemar Aguiar não pode esperar. "No dia 5 de junho temos que entregar as chaves do Riocentro às Nações Unidas. Eles hasteiam a bandeira e vira território da ONU. O Rio passa a ser Nova York", diz, fazendo referência à sede das Nações Unidas.

O desafio deste diplomata, que era ministro conselheiro da embaixada brasileira em Paris até receber o convite para ser o responsável pela logística da Rio+20, é organizar a festa sem saber quantos convidados virão - e nem se virão. "Trabalhamos com estimativas históricas, mas sempre com margem de acréscimo", diz. "O que não pode acontecer é nos prepararmos para receber 10 e chegarem 20."

O orçamento aprovado pelo Congresso para a conferência, em 15 de dezembro, é de R$ 430 milhões. Deste, R$ 230 milhões irão para a segurança e R$ 190 milhões, à logística. Os contratos de aluguel dos espaços somam R$ 30 milhões. "Tudo será transparente, todos os gastos comprovados", diz Aguiar, secretário-geral do Comitê Nacional de Organização da Rio+20. "Há enorme interação", garante, salientando o trabalho em conjunto com a Prefeitura e o Estado do Rio.

Uma das marcas que a Rio+20 persegue é a de ser uma conferência com o "máximo de participação possível da sociedade civil", diz Aguiar, repetindo o mantra que vem sendo dito pelo alto escalão do governo. "Estamos discutindo o que vai ser o planeta. O documento que sair da Rio+20 será acertado entre governos, mas queremos que tenha o máximo de 'inputs' de todos os setores da sociedade."

O desafio da logística é conseguir fazer com que o deslocamento no Rio seja o melhor possível - estão em estudos vários planos de fluxo de trânsito - reduzindo a distância do Riocentro, na Barra da Tijuca, com o resto da cidade. Também por isso, inicialmente, a conferência iria ser na região do porto. Tudo - evento oficial e todos os paralelos - seriam concentrados ali. A iniciativa iria exigir uma grande obra de revitalização da área, legado que ficaria para a cidade. As docas eram, por este motivo, a opção da Prefeitura. Mas não deu certo. "Por diversas razões, logística, segurança, infraestrutura e também custos", explica Aguiar. "Ao passar para o Riocentro digo que trocamos dez problemas por um: o grande problema da Barra é o acesso. Vamos fazer um trabalho muito grande em relação ao transporte", promete.

Uma das grandes diferenças da Rio+20 com a Eco 92 é a prioridade que os chamados "major groups" têm hoje em relação há 20 anos. O conceito, em voga nas Nações Unidas, reúne nove segmentos da sociedade civil - empresas, crianças e jovens, produtores agrícolas, comunidades indígenas, governos locais, ONGs, cientistas, mulheres, trabalhadores e sindicatos - e é intenção do governo aproximá-los o máximo das decisões da conferência. Na edição de 1992, os governos reunidos no RioCentro, e a sociedade civil, no Aterro. Eram dois mundos separados. A arquitetura proposta agora é diferente.

Segundo ele, na Rio+20, "pela primeira vez em uma conferência das Nações Unidas, a sociedade civil terá vários lugares diferentes para se reunir", adianta. A sugestão é de oferecer, na Barra da Tijuca, o Parque dos Atletas (ex-Cidade do Rock), para que governos nacionais e locais possam montar pavilhões e estandes. O Autódromo de Jacarepaguá é uma grande área que está disponível para a sociedade civil - grupos indígenas estudam montar ali grandes ocas e também empresas avaliam se é o caso de usar parte dos 550 mil m2 do local. Está sendo alugada a Arena da Barra (o HSBC Arena), um moderno ginásio coberto com capacidade para 18 mil pessoas.

Áreas no centro do Rio são a outra opção para os eventos da sociedade civil. Aguiar cita a região ao redor do Museu de Arte Moderna (MAM) e do Monumento aos Mortos da Segunda Guerra Mundial. O Vivo Rio, com capacidade para 2 mil pessoas, seria outra área para seminários e reuniões. "Em 92 usou-se todo o Aterro, o que não dá para fazer agora", diz, lembrando que a grama foi destruída. A região, sem ocupar as áreas gramadas, é a área predileta das ONGs e dos movimentos sociais. Aguiar diz que, se faltar espaço, a Quinta da Boa Vista funcionará como uma espécie de "área back up".

Para agilizar as contratações, a organização da Rio+20 fez uma força-tarefa com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), das Nações Unidas. O PNUD pode ir mais rápido nas contratações necessárias, agilizar contratos e escolher fornecedores não só pelo critério do menor preço, mas considerar outras variáveis, como qualidade, por exemplo. A licitação sobre a empresa que cuidará da hospedagem e viagens das delegações oficiais foi decidida esta semana. "Mas as pessoas terão que se hospedar também em cidades próximas", estima Aguiar. A rede hoteleira carioca tem, no máximo, 33 mil quartos, incluindo flats. Só de credenciados a previsão é chegar a 50 mil. "Terão que se hospedar também na casa das pessoas", prevê.

A Rio+20 terá novidades de conectividade, acessabilidade e sustentabilidade, promete Aguiar. "Teremos a menor utilização de papel possível e o maior uso de novas tecnologias", exemplifica. O metrô do Rio será o primeiro metrô com mais de dez anos totalmente acessível. Geradores a biodiesel, copos de papel, coleta de lixo seletiva são alguns dos critérios de sustentabilidade adotados.

Dez mil pessoas terão de ficar acampadas


Por De São Paulo

O Aterro do Flamengo, que abrigou o mítico Fórum Global das ONGs em junho de 1992, é o espaço que organizações ambientalistas, redes sociais, grupos indígenas e de agricultores, movimentos sociais, de mulheres, jovens e negros pretendem ocupar na Rio+20. A escolha é curiosa: há 20 anos a maior crítica da sociedade civil à conferência era a distância e o tempo que levava para chegar ao evento dos governos, no Riocentro.

A intenção é organizar no Aterro a "Cúpula dos Povos" - alusão ao nome do encontro dos líderes mundiais. "Temos duas motivações principais para desejarmos ficar ali", diz Fátima Mello, da Fase e do comitê facilitador da sociedade civil para a Rio+20. "Uma é muito simbólica: é no Aterro que corre a herança do Fórum Global", diz. "A outra é que queremos fazer um evento aberto, que dialogue com a cidade e o Aterro é o melhor lugar para isso." O plano foi apresentado à comissão dos governos federal, estadual e municipal que organiza a Rio+20. "Mas estamos abertíssimos à negociação", adianta ela.

As estimativas são de ter 10 mil pessoas acampadas, mas não no Aterro, em parques próximos. Em 1992, o uso intenso da área estragou a grama. O Aterro é patrimônio, e a negociação com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) pressupõe que as áreas gramadas não podem ser usadas e, se houver estragos, as ONGs terão que arcar com o custo da restauração. O plano prevê um acampamento com 5 mil jovens, outro com 2 mil camponeses, e dois espaços com 800 e mil índios.

O Aterro será chamado de "Território do Futuro", adianta Fátima. "Queremos trazer, para a cidade, a indignação do mundo com o estado do mundo", conta. Virão representantes do Ocupem Wall Street, dos "indignados" europeus. Os locais serão abastecidos com produtos da agricultura familiar, haverá uma zona digital livre, geração de energia limpa e muita reciclagem. No Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, na semana que vem, esta preparação irá avançar.

Os empresários também discutem onde fazer seus eventos no Rio. "O momento é de tentar imaginar com qual tipo de público queremos falar e discutir quais seriam os melhores lugares", diz Sheila Guebara, assessora da presidência do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds). "Sabemos que serão dez dias de intenso trabalho", continua. O Cebds é uma coalizão de grandes grupos empresariais que tem entre associados a Vale, Petrobras, Amil, Dow, Votorantim, Itaú e Bradesco.

Entre as iniciativas já programadas do Cebds há a visita e apresentação do projeto-piloto "Rio Cidade Sustentável" que acontece em duas favelas do Rio, Chapéu Mangueira e Babilônia. Em 19 de junho acontece um evento empresarial global, o Business Day, ainda sem local definido. A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) deve fazer uma feira de tecnologias verdes no Pier Mauá. Empresas com temática de mobilidade urbana podem ocupar espaços no Autódromo de Jacarepaguá. (DC)

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

CoP-17 e as mudanças climáticas: avanços lentos



Por Malu Nunes - Valor 18/01

A CoP-17 da Convenção do Clima levantou esperanças e dúvidas. Os compromissos acordados serão efetivamente assumidos pelo Brasil e pelas outras nações? E serão colocados em prática a tempo de garantir a estabilidade climática do planeta?

O principal compromisso firmado no evento da África do Sul foi a Plataforma de Durban, um roteiro para um acordo global de redução de gases de efeito estufa, que estabelece um calendário para se criar, até 2015, um instrumento legal vinculante. A grande conquista do novo acordo é que todos os países membros da Convenção do Clima (as chamadas Partes) terão metas obrigatórias a cumprir a partir de 2021 - inclusive o Brasil que, pela primeira vez na história das conferências, aceitou ter metas obrigatórias de redução de suas emissões.

Para amenizar o déficit entre 2012 - quando se encerra o primeiro período de compromisso do Protocolo de Kyoto - e 2021, também foi aprovada na CoP -17 a renovação de Kyoto por mais cinco anos, até 2017. Essa foi uma solução paliativa, mas não ideal, uma vez que importantes países ficarão de fora dessa ampliação, como Estados Unidos, Rússia, Japão e Canadá.

Haverá um período longo para que as Partes comecem a ter metas obrigatórias e significativas de redução das suas emissões. O problema é que com essa espera talvez não haja tempo para evitar que o aumento da temperatura média do planeta não ultrapasse os 2º C.

Com a elevação acima desse limiar, os impactos das mudanças climáticas tendem a ser críticos: muitas espécies e ecossistemas poderão ser extintos; populações humanas sofrerão ainda mais com secas, enchentes e furacões; e países inteiros podem vir a desaparecer pela elevação do nível dos oceanos.

Portanto, não é mais possível continuar apenas discutindo, como tem sido feito desde a assinatura da Convenção do Clima, no Rio de Janeiro, em 1992. Os países - incluindo aí governos, iniciativa privada e sociedade civil - não podem apenas aguardar as definições do novo acordo. Eles precisam se antecipar e tomar providências ainda nesta década.

O que nos traz esperança é que alguns países já estão investindo maciçamente em tecnologia, migrando para uma matriz energética mais limpa e realizando outras iniciativas que os colocarão em vantagem no futuro, quando essas questões de mitigação das mudanças climáticas forem regulamentadas e se tornarem obrigatórias.

O Brasil também está caminhando para as mudanças, mas ainda de uma forma contraditória. O país estabeleceu, por meio da Política Nacional sobre Mudança do Clima, metas voluntárias de reduzir entre 36,1% e 38,9% de suas emissões projetadas até 2020, com base nos valores de 2005. Esse é um dos maiores programas do mundo de redução voluntária de emissões.

Contudo, a aprovação do projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que altera o Código Florestal poderá pôr tudo a perder, pois permitirá novos desmatamentos e anistiará aqueles que desmataram ilegalmente no passado. Além da perda de biodiversidade, isso deverá resultar em um aumento absurdo das emissões brasileiras de gases-estufa e na redução da captação de carbono pelas áreas que deixarão de ser restauradas.
Para poder assumir uma posição de liderança perante o mundo na questão climática, é fundamental que o país proteja as suas áreas naturais. Em vez de adaptar o Código Florestal a favor de quem não o cumpriu, é preciso favorecer aqueles que preservam e isso pode ser feito por meio de mecanismos de pagamento por serviços ambientais, a exemplo do Projeto Oásis.

Também é preciso que o país crie e mantenha unidades de conservação. Todas essas áreas naturais protegidas em terras públicas e privadas são estratégicas não só para a manutenção dos estoques de carbono, mas também para a conservação da biodiversidade, o fornecimento de serviços ambientais como produção de água, e a defesa contra os impactos das próprias mudanças climáticas.

A tendência é que conservação das florestas do Brasil e do mundo seja incorporada ao novo acordo da Convenção do Clima, já que o desmate florestal representa cerca de 17% das emissões de gases-estufa, mais do que o volume emitido por todo o transporte no planeta. O que aponta para isso são as negociações em torno dos mecanismos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd), cuja proposta é compensar financeiramente os países em desenvolvimento por reduções voluntárias e comprovadas de suas emissões nacionais por meio da conservação de suas florestas.

Na CoP-17, o Redd avançou pouco em relação ao ano passado, pois não houve definição de fontes de financiamento, mas pelo menos o tema continuou a ser discutido.

Foi uma grande conquista o mundo ter acertado na CoP-17 as bases para um novo acordo legalmente vinculante com participação dos Estados Unidos e todos os países que participam da Convenção do Clima. Porém, a conferência de Durban pouco adicionou em ações concretas que possam fazer com que o mundo mantenha a meta de não deixar o planeta aquecer em mais de 2º C.

Se não tomarmos cuidado e esperarmos muito para agir, podemos chegar a níveis de emissões preocupantes nos próximos anos, antes mesmo de o novo acordo entrar em vigor. O Brasil pode e deve se antecipar e fazer sua parte, e uma das principais contribuições que o país pode dar ao mundo é conservar a sua rica biodiversidade.


Malu Nunes é engenheira florestal, mestre em Conservação da Natureza e diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.