quarta-feira, 7 de julho de 2010

CONSEQUENCIAS DA PECUÁRIA

A pecuária é uma das atividades humanas mais impactantes, responsável por grande consumo de água, grãos, combustíveis fósseis, pesticidas e drogas e fornecendo de volta, além de seus produtos (carne, leite e ovos), também a destruição de ecossistemas, perda de biodiversidade, erosão do solo, desertificação, escassez de água, contaminação do solo e da água e efeito estufa.

Estas consequências ecológicas se refletem também em problemas sociais, quando incidem sobre a disputa por território e o problema da fome. Quando falamos da fome, precisamos analisar bem os dados. Produzimos mais caloria do que consumimos (veja o quadro), portanto a fome não teria justificativa.

Produção mundial de grãos 1,86 bilhões de toneladas
Produção em calorias 7,5 quadrilhões
População mundial 6,5 bilhões de pessoas
Necessidades calóricas desta população 6 quadrilhões Cal. produzidas menos cal. requeridas 1,5 quadrilhões

Para onde vão estes 1,5 quadrilhões de calorias que sobram todos os anos?
Para a alimentação de animais.
Muitas pessoas argumentam que não há nada de errado em alimentar animais com grãos que serviriam para alimentar seres humanos, se depois comeremos estes animais.
Mas acontece que quando usamos animais como transformadores de energia, quando criamos um elo na pirâmide de niveis tróficos, estamos disperdiçando energia. Dependendo de quais grãos estamos falando, são necessário de 11 a 17 calorias para criar apenas uma caloria de carne. Estes grãos seriam usados mais eficientemente se consumidos diretamente por seres humanos.
As consequencias disso para a questão da fome são óbvias. Quantas pessoas posso sustentar em uma mesma área comendo animais e vegetais?

Fizemos as contas. Veja os dados que obtivemos considerando a produtividade brasileira deste ano:
Milho - 26 pessoas/ha/ano
Soja - 11 pessoas/ha/ano
Arroz - 14 pessoas/ha/ano
Feijão 14 pessoas/ha/ano
Trigo - 8 pessoas/ha/ano Mandioca - 23 pessoas/ha/ano Leite - 0,62 pessoas/ha/ano
Carne - 0,08 pessoas/ha/ano

Ou seja, a carne permite o sustento de 100 vezes menos gente do que o trigo, que já não é um produto adequado em nossas terras

Fiz as contas utilizando um dado da FAO, que diz que todos os anos 465 milhões de toneladas de grãos são usadas na alimentação de gado. Menos de 0,30% desta quantidade já seria suficiente para salvar da fome mais de 6 milhões de crianças menores de 5 anos que morrem de desnutrição todos os anos. Com 2,5% desta quantidade já resolveriamos o problema da fome no Brasil (46 milhões de famintos). Com 50% disto resolveria-se o problema da fome no mundo inteiro.

Os pastos podem ser encarados como grandes superfícies estéreis. Eles ocupam 3,4 bilhões de ha do mundo, 2/3 da superfície agriculturável. A demanda por novos pastos ocasiona novo desmatamento. Não são as madeireiras, mas os pecuaristas que desmatam a Amazônia. Mais de 1/3 do gado brasileiro está naquela região. Lá para cada 1 hectare de cultura tem 6 hectares de pasto. Destruir florestas para criar pastos significa destruir habitats naturais, destruir a biodiversidade para estabelecer no local uma "monocultura" de bovinos. Os animais que sobrevivem a esta destruição e de alguma forma se adaptam a estas novas condições acabam sendo considerados 'pragas' pelo pecuarista, porque ou competem com o gado pelo pasto ou acabam atacando o gado.
Eles são destruidos.
Ano após ano pastando no mesmo lugar e os animais acabam esgotado o pasto. Além da retirada de nutrientes, o gado compacta o solo e impede o rebrotamento. Muitos destes pastos passam a ser varridos pelos ventos e arrastados pelas águas de chuva. Os resultados são as voçorocas e a perda de fertilidade. A evolução deste processo é conhecida como 'desertificação'. É possivel que o deserto do Sahara tenha sido resultado da ação de tribos nômades que passaram ali por muito tempo com ovelhas, cabras e camelos. Sabemos que ali era antes uma região fértil. Também hoje podemos observar que cresce o deserto da China e até no Amazonas. Tudo resultado da pecuária. Áreas que perderam sua cobertura vegetal tendem a apresentar temperaturas 4º C maior do que apresentavam antes. Fora isso, o gado também contribui com os gases do efeito estufa CO2, metano e oxido nitroso, seja pela flatulência, seja pela eructação.
Ou seja, a pecuária está diretamente relacionada ao aquecimento global.

Falemos então da escassez de água. A pecuária utiliza água em diferentes partes de seu processo. Água é utilizada para irrigar os campos que fornecerão grãos para o gado e temos dados que dizem que a irrigação não seria necessária se não fosse pela pecuária, pois somente precisariamos ocupar terras propícias para o cultivo de alimentos, sem necessidade de irrigação.

Temos de considerar também a água utilizada na pecuária para dessedentação de animais. Veja no quadro abaixo quanta água cada espécie animal consome por dia

Espécie Litros/unid./dia
Bovino 50
Bubalino 60
Eqüídeo 40
Ovinos 7
Suínos 20
Caprinos 7
Aves 0,36

Fora isto, água também é utilizada no processamento de carcaças, nos abatedouros e matadouros. Dados do Estado de S. Paulo mostram que para o processamento de uma única carcaça de frango são necessários 11,9 litros de água.
Para o processamento de uma só carcaça bovina são necessários de 2.500 a 3.900 litros.
Apenas para comparar cada pessoa utiliza de 120 a 150 litros de água por dia. Apenas 8% da água captada é destinada para consumo humano. O caso da água é extremamente alarmante. O estoque de água do planeta é o mesmo desde sempre. A população, pelo contrário, cresce de ano para ano. Os padrões de consumo desta população também, estão cada vez mais refinados. Por outro lado, atualmente 1/3 da população do mundo já vive em países com escassez de água(< 2.000 m³/capita/ano). A projeção é de que em 2025 sejamos 2/3 da população vivendo nestas condições.
Temos ainda o problema da associação da pecuária com a contaminação do solo e da água. Excrementos animais quando atingem corpos de água ocasionam em eutrofização, proliferação de algas, mortandade de peixes, risco à saúde pública e de contaminação.
A disposição de esterco no solo, se não for bem feita não é adubo, mas veneno. Na Europa e EUA já temos grandes quantidades de solos contaminados apenas por excrementos animais. Dispor adequadamento implicaria em curtí-lo; por mais de 120 dias, tratá-lo, transportá-lo e distribuí-lo nos campos. Isto significa custos que o pecuarista não quer ter, porque não pode ser repassado para a carne.
A carne é barata porque nela não estão embutidos os preços da floresta, dos animais que vão à extinção, do solo que se perde, da poluição ocasionada, da água desperdiçada e em muitos casos dos grãos consumidos pelo gado. Apenas isto torna a pecuária uma atividade economicamente viável. Não devemos ver nela, porém, uma atividade importante para o Brasil, pois embora o dinheiro agora esteja entrando, às custas de que isto vem acontecendo? O pecuarista sem dúvida lucra, nós não.

Sérgio Greif
Departamento de Meio AmbienteSociedade Vegetariana Brasileira

A Pecuária e as Mudanças Climáticas*

A destruição das florestas para abertura de pastos e campos de cultivo para alimentação do gado tem diversas implicações, como o comprometimento da biodiversidade e a promoção de processos erosivos e de desertificação. Mas a importância das florestas não se limita à preservação de nossos recursos hídricos e absorção de poluentes, as florestas também funcionam como sumidouros de carbono da atmosfera, contribuindo para a regulagem do clima global. Quando as plantas realizam fotossíntese, captam CO2 da atmosfera e aproveitam este carbono para a síntese de diferentes moléculas orgânicas, inclusive seus próprios tecidos. A queima de uma floresta devolve para a atmosfera grande parte deste carbono absorvido pelas plantas. Estudos mostram que pelo menos 70% das emissões de gases do efeito estufa estão relacionadas ao desmatamento e à pecuária. Pecuária e gases de efeito estufaOs gases do efeito estufa são principalmente o dióxido de carbono, o metano, os clorofluorcarbonetos (CFCs) e os óxidos de nitrogênio. A queima de matéria orgânica (madeira e combustíveis hidrocarbonetos), como vimos, está relacionada com a emissão de dióxido de carbono. O nitrogênio proveniente dos resíduos animais é fonte importante do óxido nitroso (N2O). As emissões de N2O dos solos ocorrem principalmente como consequência da desnitrificação a partir de nitrogênio mineral (N). A desnitrificação consiste na redução microbiana do nitrato (NO3) às formas intermediárias de N e então às formas gasosas (NO, N2O e N2) que são comumente perdidas para a atmosfera. Estima-se que as emissões globais de N2O pelo homem sejam de cerca de 5,7 milhões de toneladas de nitrogênio por ano. As emissões diretas por parte de animais de criação comercial (principalmente bovinos e suínos) foram estimadas em 1,6 milhões de toneladas de nitrogênio por ano.
A pecuária é também uma das maiores fontes de emissão de gás metano para a atmosfera. O processo de formação do gás ocorre durante o processo digestivo de fermentação entérica de animais ruminantes (bovinos, bubalinos, ovinos e caprinos), sendo o metano subproduto deste processo, liberado para a atmosfera através da flatulência e eructação dos animais. Em média, estima-se que 6% de todo o alimento consumido pelo gado no mundo seja convertido em gás metano. O metano é 24 vezes mais potente do que o dióxido de carbono para causar aquecimentos atmosféricos, contribuindo com 15% do total do aquecimento global. Emissões de metano pela pecuária
O rebanho mundial de bovinos é hoje estimado em mais de 1 bilhão de cabeças. A EPA (2000) estimou as emissões globais de metano geradas a partir dos processos entéricos de ruminantes de criação em 80 milhões de toneladas por ano, correspondendo a cerca de 22% das emissões totais de metano geradas por atividades humanas. O mesmo relatório estimou a emissão proveniente de dejetos animais em cerca de 25 milhões de toneladas ao ano, correspondendo a 7% da emissão total.
O Brasil possui o maior rebanho bovino comercial do mundo. De acordo com o Inventário Nacional das Emissões de Gases de Efeito Estufa provenientes de Atividades Agrícolas, realizado desde 1996 pela Embrapa Meio Ambiente, 96% do metano produzido na agricultura do país provém da pecuária bovina de corte e de leite. Outros animais como bubalinos, muares, caprinos, asininos, eqüinos e suínos são responsáveis pelos 4% restantes das emissões de metano. Cerca de 68% da pecuária nacional é representada por bovinos (87% correspondendo aos bovinos de corte e 13% aos bovinos de leite). Estimou-se que as emissões de metano pela pecuária brasileira em 1995 fora de cerca de 9,2 milhões de toneladas de CH4, considerando-se os efetivos de bovinos (160 milhões de animais) e a produção de dejetos animais à época.

Efeito estufa e alterações climáticas

O efeito estufa é um processo natural que permite manter parte do calor irradiado pela Terra na atmosfera. Sem este efeito, a temperatura na superfície da Terra à sombra seria de - 4ºC (quatro graus centígrados negativos). No entanto, o acumulo atmosférico de gases do efeito estufa que passou a ocorrer a partir da industrialização e aumento nas atividades pecuárias tem levado a um rápido aumento das temperaturas médias terrestres.
Estima-se que, se a taxa atual de aumento de gases do efeito estufa no planeta continuar pelo próximo século, as temperaturas médias globais poderão subir até 0,8 ºC por década. Desta forma, em 2100 a terra poderia estar 3,5 ºC mais quente do que é hoje. Tal aumento nas temperaturas implicaria em drásticas e graves conseqüências em escala global. Parte destas conseqüências pode ser facilmente verificada, através do aumento na freqüência de desastres naturais. Não para menos, do clima dependem os regimes de ventos e chuvas, das correntes oceânicas, a umidade do solo, radiação solar e o fluxo de águas superficiais entre outros. Alterações climáticas implicam não apenas em desequilíbrios ambientais e extinções em massa de animais e plantas, mas afetam diretamente atividades humanas, como a agricultura, por exemplo.

*Sérgio Greif
Biólogo, Coordenador do Departamento de Meio Ambiente da Sociedade Vegetariana Brasileira, Mestre em Alimentos e Nutrição, Especialista em Nutrição Vegetariana

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